quinta-feira, 21 de maio de 2015

Mulher Moderna: acúmulo de papéis pode afetar a saúde mental feminina

O  desempenho concomitante de diferentes funções é uma das características marcantes da mulher contemporânea. Mãe, esposa, profissional, cidadã, mulher; inúmeros são os papéis assumidos pelo público feminino desde a sua emancipação. Não obstante, a pressão imprimida pela indústria da “beleza”, para o alcance de padrões estéticos cada vez mais distantes da realidade, atua como fator adjunto à sobrecarga emocional. Diante disso, o grande desafio é aprender como manter a saúde mental e, principalmente, a qualidade de vida apesar dos diversos agentes internos e externos que contribuem para o surgimento de transtornos emocionais e mentais femininos. Que atitude a mulher deve adotar para vencer o desafio diário de conciliar diferentes tarefas de maneira satisfatória? Na avaliação da psicóloga especialista em Psicologia Clínica Hospitalar, Ana Paula Brasiliano, por mais que a sociedade imponha uma construção de modelo ideal feminino, não existe uma atitude ou uma receita que possa garantir que a mulher consiga a satisfação plena. “Uma vez que consideramos o sujeito como um ser faltante, o caminho seria uma melhor convivência com essa falta”, pondera.



Muito mais que cansaço e estresse, a múltipla jornada pode desencadear sérios problemas à saúde mental feminina. Entre os casos mais comuns aparecem os transtornos ansiosos e depressivos, como explica o psiquiatra e psicanalista Gabriel Ferreira Câmara. “O estresse é uma palavra vaga, é importante buscar suas motivações. Já a ansiedade é uma resposta natural do ser humano ante as vivências. A emancipação feminina de fato mudou a forma de atuação da mulher na sociedade. Desempenhar muitas atividades ao mesmo tempo pode gerar ansiedade e até angústia, que provoca sensações como palpitação e aperto no peito (a pessoa angustiada sente tudo isso). Há momentos em que a ansiedade se torna grave. Então, quando ela se torna um fator que altera a qualidade de vida e interfere na rotina de forma intensa, é preciso buscar a ajuda de um especialista que vai avaliar a forma mais adequada de terapia para aliviar essa sobrecarga. O mesmo vale para a depressão, pois a vida deixa de seguir o seu curso normal. Hoje o arsenal de medicações para o tratamento dos transtornos psiquiátricos aumentou”, informa.

O médico explica que as mulheres se mostram mais propensas a desenvolverem transtornos de ansiedade, como síndrome do pânico e fobias simples, porque a subjetividade se apresenta de maneira diferente entre os gêneros, tendo uma maior incidência entre as pessoas mais jovens. “As motivações são sempre muito particulares. Qualquer pessoa está passível de sofrer um transtorno mental em alguma fase da vida, por questões internas e externas. O que ocorre é que a mulher tem mais acesso aos seus conteúdos emocionais, expressando mais livremente a sua emotividade do que o homem que, por exemplo, aprende desde cedo que ‘homem não chora’ porque é um sinal de ‘fraqueza’. A nossa cultura ainda permanece machista e isso é internalizado desde a infância”, avalia.

A depressão é outra doença predominante entre o público feminino. “Esta é uma desordem psiquiátrica muito mais comum do que se imaginava. Pesquisas indicam que o número de casos de depressão em mulheres é muito superior do que em homens”, afirma a psicóloga Ana Paula Brasiliano. Apesar disso, as pessoas ainda encontram dificuldade em diferençar o estado deprimido e a depressão. Para o diagnóstico de depressão foram criados alguns critérios no DSM IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 4ª edição) baseados numa lista de sintomas - além do estado deprimido - que devem ter uma intensidade e duração. “A depressão é diferente do estado deprimido. Estar somente triste não significa que se tem depressão. Até porque os sintomas da depressão interferem significativamente na qualidade de vida. Somente um especialista pode fornecer um diagnóstico preciso”, reforça a psicóloga. Mas, como os familiares devem agir ao perceberem que a mulher está vivenciando uma dificuldade emocional? A especialista lembra que os transtornos à saúde mental trazem um sofrimento psíquico não só para quem sente e vive a doença, mas se estende para toda família, o que pode gerar conflitos e até encobrir os sintomas. “É importante que os familiares estejam atentos para as mudanças de conduta e favoreçam a busca de uma ajuda profissional. Contudo, o contexto familiar em que a mulher se encontra, a maneira como ela se relaciona com essas pessoas e se ela própria deseja ajuda são pontos importantes a serem refletidos”, observa.

Embora não seja um fator determinante, o histórico familiar deve ser um sinal de alerta para mulheres com casos de doenças psiquiátricas na família. A hereditariedade não significa uma certeza de torná-las mais propensas a desenvolverem esses problemas, pois fatores culturais, econômicos, familiares, comportamentais e psicológicos também estão envolvidos no processo de estabelecimento dessas doenças, segundo a psicóloga. “É possível perceber a existência de alguns sintomas, porém estes podem ser confundidos com outras alterações de comportamento, além da depressão e transtornos alimentares. Portanto, é relevante a busca de um profissional especializado para que seja adotado o tratamento adequado nesses casos. Na verdade, se torna importante que a mulher reconheça que precisa de ajuda e não pode se curar sozinha” observa Ana Paula Brasiliano.

Entre as formas de terapia disponíveis para os problemas mentais estão a psicoterapia e, a depender do caso, o acompanhamento psiquiátrico, quando for necessário o uso de medicações regulares. “Não importa a abordagem teórica em que o psicólogo se oriente (psicanálise, cognitivo comportamental, junguiana, gesltat, transpessoal) e sim como o profissional direciona o tratamento”, ressalta Ana Paula Brasiliano. Ela lembra que as pessoas buscam diferentes receitas para aplacar a própria angústia e de preferência que estas “caiam no colo” de forma rápida. Contudo, acabam frustradas já que a representação da autoestima é muito particular. “O que pode ser significativo para uma mulher pode não ter a menor importância para outra. Essa definição totalmente subjetiva acaba sendo complexa, pois não tem a ver somente com o amor próprio, mas também com a exigência da sociedade moderna que está sempre sofrendo modificações. O fortalecimento da autoestima pode não estar apenas associado à correspondência das demandas externas e ser socialmente reconhecido, mas efetivamente aos anseios pessoais”, reflete a psicóloga.

De modo geral, a recomendação médica é de que os acompanhamentos psiquiátrico e psicológico sejam de longo prazo, com duração mínima de um ano. Nas situações em que é recomendado o acompanhamento psiquiátrico a prescrição do uso de medicamentos para tratar a saúde mental da mulher deve ser avaliada caso a caso, de acordo com Gabriel Ferreira Câmara. “O paciente e o médico juntos devem perceber a terapia mais adequada. É indicado manter a medicação que a mulher apresenta melhor resposta e retirar o remédio apenas de forma gradativa”, observa o especialista, informando que as medicações comumente usadas são os antidepressivos. “O paciente não deve se automedicar, bem como, não deve decidir sozinho quando interromper o tratamento”, alerta.

Diante de tantas pressões e responsabilidades, afinal, qual o caminho para a mulher manter a qualidade de vida? Para Gabriel Ferreira Câmara a mulher deve buscar reconhecer seus desejos e suas limitações. “Não existe uma receita de bolo. Por isso, a mulher precisa encontrar dentro de si o que a torna feliz. Ela deve descobrir seus anseios, o que considera importante, buscar suas respostas”, considera o médico, que manda outro recado para quem está passando por dificuldades emocionais. “Se a mulher perceber, em algum momento de sua vida, que está num nível de ansiedade muito intenso e que isto está fugindo ao seu controle, ou se ela está muito triste e desinteressada pela vida, é interessante que procure um profissional para uma consulta e acompanhamento adequado. No tratamento será possível avaliar a necessidade de usar um suporte medicamentoso ou não. É importante que a paciente vença os próprios preconceitos”, conclui.

TRANSTORNOS ALIMENTARES

Menos comuns do que outras doenças mentais que afetam as mulheres, os transtornos alimentares também oferecem danos importantes à qualidade de vida feminina. De acordo com estudos, transtornos como anorexia e bulimia nervosa atingem 1% das mulheres entre 18 e 40 anos, sendo aproximadamente dez vezes mais comuns em mulheres que em homens. Esses transtornos, devido à busca incessante pelo corpo perfeito, afetam de forma significativa a sociedade contemporânea. As adolescentes, em processo de formação psicológica e emocional, muitas vezes são “bombardeadas” por modelos de estética difundidos pelas mídias, tornando-se vulneráveis ao problema. “A anorexia nervosa geralmente tem início na adolescência, período marcado por transformações, quando a menina passa pela aceitação de ser mulher. Nessa doença, a autoimagem é totalmente distorcida da realidade. A mulher olha no espelho e se vê acima do peso, o que motiva a ideia fixa de emagrecimento”, explica o psiquiatra e psicanalista Gabriel Ferreira Câmara. Para a psicóloga Ana Paula Brasiliano “existe um colapso dos ideais e uma tirania de valores, o que gera sofrimento psíquico diante do ideal frustrado”.

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